Celebrar no tempo específico. Porquê?




Eurivaldo S. Ferreira


Nos primórdios, o tempo era um aliado cuja função era a de recriar a vida. A Bíblia nos fala da presença de Deus atuando no tempo das pessoas, o hoje vivenciando pelas ações divinas de salvação, libertação, condução etc. O tempo nos obriga à concepção do rito, àquilo que volta, que retorna, sempre com um novo sabor, com uma nova pitada de experiência.

Para o Concílio Vaticano II, na sua Constituição Conciliar, a liturgia deve ser entendida como o centro do mistério pascal. Em torno deste unem-se catequese e devoção, elementos oriundos da junção entre liturgia, teologia e espiritualidade.

Todavia é o ano litúrgico o grande encarregado de introduzir os cristãos a fim de que estes participem plena e frutuosamente do mistério de Cristo, cujo sentido se desenvolve ao longo de um ano.

Assim sendo, nos recorda a SC nº 102:
Relembrando destarte os Mistérios da Redenção, franqueia aos fiéis riquezas do poder santificador e dos méritos de seu Senhor, de tal sorte que, de alguma forma, os torna presentes em todo o tempo, para que entrem os fiéis em contato com ele e sejam repletos da graça da salvação.

Portanto, celebrar no tempo específico, consiste em apreender todo o sentido do mistério de Cristo, da sua vida, morte e ressurreição, quer seja em determinado momento do dia, da semana, do ano, ou num momento especial da vida, ao longo do ano litúrgico.

Conseqüentemente, aderindo a esse mistério, têm os cristãos o caminho perfeito e pedagógico a título das etapas do caminho fé-salvação. Trata-se de um movimento progressivo em que os cristãos, fazendo memória ritual da salvação que se realizou em Jesus ‘uma vez por todas’ e à qual, em diferentes momentos da vida, dão sua renovada adesão[1].

No centro do mistério pascal estão as celebrações do Tríduo Pascal, dentre elas merece destaque a Vigília Pascal cujo elemento tempo é significado no rito do acendimento do círio. O círio aceso no coração da noite nos lembra que é no curso do tempo que passa, no percurso entre o alfa e o ômega que todo ser humano deve encontrar o sentido da sua existência, a plenitude do seu tempo, aprendendo a viver cada momento como kairós, ao mesmo tempo transcendendo os limites de tempo pela promessa da imortalidade[2].

Para Carpanedo, na prática, fala do tratar de se fazer da própria celebração uma experiência que transforma e anima todo no nosso ser (corpo, mente e coração) e que se prolonga na vida cotidiana e em nossa missão no mundo. Concretamente, o que se propõe é fazer bem a ação ritual e prestar atenção em cada gesto e palavra, acompanhando com a nossa mente e o nosso coração aquilo que a boca proclama e o corpo realiza[3].

Celebrar no tempo é colocar no centro o Cristo e sua ação pascal no meio de nós.



[1] CARPANEDO, Penha. Para viver a Quaresma. São Paulo: Ed. Apostolado litúrgico. 2007. In Revista de Liturgia, nº 199, janeiro/fevereiro-2007. p.4.
[2] CARPANEDO, Penha. Um tempo para celebrar. O ano litúrgico na Sacrossanctum Concílium. São Paulo: ED. Apostolado litúrgico. 2003. In Revista de Liturgia, nº 180, novembro/dezembro-2003, p. 4.
[3] Ibid.

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