Aspectos teológicos da Celebração da Ceia do Senhor


Eurivaldo Silva Ferreira

A Eucaristia é memória da cruz, memória de alguém que deu sua vida numa cruz, pois tinha que anunciar a verdade do amor de Deus que liberta. Jesus, percebendo essa realidade de que não vai escapar mais, faz a memória dessa libertação que o levou para a morte, re-significando na páscoa judaica sua própria páscoa. “Para deixar meu povo livre, eu não me arrependo de nada que fiz, e façam a mesma coisa que eu fiz, como sinal de memória. Não deixem ninguém no desamor, fora dos benefícios da sociedade”. E em sinal simbólico e sacramental parte o pão, e pega o cálice com vinho, dividindo-o entre os seus convidados. O cálice é sinal da Aliança, reportando aquela Aliança firmada entre Deus e o povo do Antigo Testamento.

No AT, o sangue dos animais sacrificados no templo era o sinal do sacrifício, era a oblação, a oferta que subia a Deus, com sangue lavado na terra, para agradá-lo. Jesus projeta no cálice com vinho o seu próprio sacrifício, atualizando o ato dos antigos em que sacrificavam animais no templo. Agora já não é mais o sangue daqueles animais, mas o vinho é sinal do sangue de Jesus derramado em favor de muitos.

No sacrifício está a ideia de ‘tornar sagrado’, que corresponde ao mesmo que doação, como uma mãe que se doa para salvar seu filho. Oferecer a vida para salvar o outro nos recorda o episódio dos 33 mineiros soterrados no Chile, no início de 2011, evento que teve repercussão mundial. Cada mineiro que era retirado da mina naquele meio de transporte era uma espécie de ressurreição. O último a ser retirado era o líder de todos. Essas imagens comoveram o mundo.

O pão que é partilhado não é simplesmente um pão, mas é um símbolo sacramental que recorda a libertação do outro. Libertar e viver na liberdade significa agora viver segundo o Espírito, nos recorda o apóstolo Paulo.

Partilhar o pão na mesma mesa significa que nós assumimos a radicalidade de nos responsabilizar e concordar com a vida do outro, partilhando das mesmas ideias, dos mesmos princípios. Por isso entendemos que quem partilha o pão eucarístico, liberta-se e liberta os outros de tudo quanto é ação que impere o comprometimento e o compromisso de implantação do Reino de Deus. A Eucaristia tem que nos devotar a esse compromisso.

A celebração da Quinta-feira Santa tem seu término com um prolongamento reflexivo desta teologia celebrada de forma ritual, que se dá com a prática da adoração ao Sacramento do Corpo do Senhor num lugar em separado da igreja principal, chamado de lugar da reposição (cf. Carta Preparatória para as Festas Pascais), o qual representa um convite ao recolhimento e à oração silenciosa, interiorizando a grande oração da Eucaristia, momento em que cada um/a poderá fazer sua oração pessoal, junto a Jesus eucarístico.

O sentido da adoração remete-se ao agradecimento pelo dom que nos foi dado pelo Senhor, ao mesmo tempo resgata em nós o sentido da vigília, pois naquela noite Jesus reclamou aos seus discípulos: ‘será que não podem vigiar comigo pelo menos por um instante?’.

Depois a adoração cede lugar ao pensamento da Paixão, assim que começar – depois da meia-noite – a Sexta-feira da paixão. Por isso a Quinta-feira santa é o lugar memorial da morte pascal de Cristo.

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